miércoles, 13 de enero de 2010

Ensino Fundamental: conteúdos, metodologias e práticas. Campinas, SP: Editora Alínea, 2009

FONSECA, Selva Guimarães (org.) Ensino Fundamental: conteúdos, metodologias e práticas. Campinas, SP: Editora Alínea, 2009.

Rafael Cardoso de Mello*

(ELO/USP - Ribeirão Preto-SP / Brasil)

Introdução

Em novembro deste ano (2009), ao participar de um evento cuja temática central foi Educação[1], me deparei com muitas novidades no abordar do ensino de História e de Geografia na sala de aula. Não apenas nas falas dos palestrantes e comunicadores, nos debates promovidos pelos Grupos de Trabalho, mas principalmente nos materiais produzidos por diversos autores em muitas escolas e universidades do pai. Todos elementos que explicitam o quanto andamos e pretendemos ainda caminhar no futuro destas duas áreas: Geografia Escolar e História Escolar.

Neste aspecto, chamou-me a atenção a mais recente obra organizada pela Profa. Selva Guimarães Fonseca, cujo título é: Ensino Fundamental: conteúdos, metodologias e práticas. Uma coletânea de textos com propostas atreladas a várias áreas do conhecimento, cada qual representando seus lugares sociais e suas respectivas experiências com a educação.

Divididas em sete áreas do conhecimento escolar, os autores se debruçaram em escrever sobre Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Arte e Educação Física, todas as áreas que compõe a estrutura curricular dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o Ensino Fundamental do Ministério da Educação do Brasil (1997).

Interessante notar a pluralidade de autores e perspectivas. Ao observarmos as instituições as quais os mesmos estão vinculados, podemos identificar a riqueza da coletânea. Ao todo, são 19 autores, representando a Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), Universidade Presidente Antonio Carlos (UNIPAC), para além de instituições internacionais, como a Universidad Autônoma de Barcelona.

Posto que esta resenha tem como objetivo demonstrar tal riqueza em meio a esta multiplicidade, destacarei dois textos[2] que nortearão a discussão no intuito de sintetizar a análise. São eles: É possível alfabetizar sem “História”? Ou... Como Ensinar História Alfabetizando?, de Selva G. Fonseca, representando a área de História Escolar e o segundo, de Andréa Coelho Lastória, Didática da Geografia e Geografia Escolar, como representante da Geografia Escolar.

É possível alfabetizar sem “História”? Ou... Como Ensinar História Alfabetizando?

Selva Guimarães Fonseca atualmente é Professora da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia. Com mais de 30 obras e 40 artigos acadêmicos publicados, a Professora acumulou em sua trajetória um conjunto de experiências que suscitou numa abordagem interessante de seu texto.

A autora iniciou com uma pequena biografia profissional. Alguns verbos em primeira pessoa evidenciam esta escolha, que demonstrou não apenas um conhecimento da proposta a ser discutida, com também uma reflexão da vivência do ensino de História nas últimas décadas.

De forma muito pertinente, o texto serve como uma advertência salutar. As conquistas que tivemos nas últimas décadas precisam ser lembradas e colocadas em discussão, como os próprios PCNs de História e Geografia. Assim sugere a autora, ao lembrar deste material:

Para muitos jovens educadores, esse fato pode parecer algo “normal”, “natural”, como disse, certa vez, uma aluna. No entanto, enfatizamos que isso não é algo neutro, despretencioso, nem desprovido de historicidade. É fruto de lutas sociais, políticas e educacionais, de um movimento acadêmico, de debates teóricos e políticos em defesa da valorização da História e da Geografia na educação escolar desde os anos iniciais. Foi construído nas lutas históricas da ANPUH (Associação Nacional de História), AGB (Associação dos Geógrafos do Brasil) e dos movimentos sociais de professores de norte a sul do Brasil nas últimas décadas do século XX. (FONSECA, p.245)

Estas conquistas levaram a História Escolar ser revalorizada, tanto pela academia como pelos educadores no ensino fundamental, porém, este repensar foi custoso, no entendimento da autora. A separação gradual das disciplinas de História e Geografia durante as décadas de 80 e 90, trouxe a tona as contradições resultantes do momento da junção das mesmas. Perguntas como: “O que ensinar em História? O que ensinar em Geografia? Quais eram os conteúdos da História?... O que era da História e o que era da Geografia?” (FONSECA, p.246), revelavam o desconhecimento do (não) lugar da História escolar.

Um esforço de décadas para resultados positivos. Nos dias de hoje, segundo a autora, tanto professores, educadores e formadores possuem clara compreensão de que a escola é um espaço complexo, repleto de possibilidades educativas e que o livro didático de História é apenas mais uma forma de ensinar, portanto, cabe refletir sobre as relações entre duas tarefas que raramente são vistas juntas: o ensino de História e o processo de alfabetização.

A alfabetização, o letramento e o ensino de História não ocorrem ao mesmo tempo. Numa perspectiva tradicional, muitos profissionais da educação persistem em acreditar na impossibilidade do ensino de história antes dos alunos aprenderem a ler e a escrever. Em resposta a este posicionamento, a professora Selva Guimarães utiliza da argumentação de Magda Soares, quando a mesma escreve: “... a alfabetização não precede o letramento, os dois processos são simultâneos”. (FONSECA, p.253)

Sendo a História, responsável por permitir o indivíduo conhecer a si e o grupos, comparar sociedades e pessoas, compreendendo diversidades em tempos e espaços diferenciados, é possível sim ensinar História alfabetizando, cabendo ao professor trabalhar de forma interdisciplinar e crítica, comprometido com o trabalho coletivo. A História oral se mostra como uma ferramenta poderosa neste contexto. Assim, nas palavras da professora:

... Não é necessário primeiro ensinar a ler e escrever para depois e somente depois iniciar os estudos de História. Ao contrário, a história de vida da criança, de sua família, de sua escola, de sua cultura deve ser levado em conta e contribui nesse processo.

Didática da Geografia e Geografia Escolar

A Profa. Andrea Coelho Lastória é Docente da Universidade de São Paulo, na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto. Sua experiência tanto no ensino como na pesquisa das áreas de Educação e Metodologia do Ensino de História, Geografia e Cartografia Escolar se materializa no conjunto de publicações e atuações neste campo, em especial, num material recente publicado em 2008, organizado e coordenado pela mesma - Atlas Escolar Municipal Histórico Geográfico e Ambiental de Ribeirão Preto.

Preocupada com as denominações e, portanto, a compreensão das áreas por mim referidas no começo desta resenha (História Escolar e Geografia Escolar), Andrea Lastória objetivou comparar a Geografia Escolar do Brasil com a dos países ibéricos (ênfase na Espanha). Para a autora, as diferentes nomenclatura desta área de conhecimento interferem nos conceitos e práticas por ela mantidos.

No Brasil, nos currículos dos cursos de Pedagogia, é comum variar a nomenclatura da “disciplina” responsável pelas questões que envolvem o ensino de Geografia. Lastória enumerou algumas: Fundamentos teórico-metodológicos da Geografia, Conteúdo e Metodologia do Ensino de Geografia, Geografia: conteúdos e seu ensino, Escola e conhecimento de História e Geografia, Ensino de Estudos Sociais: conteúdo e metodologia, etc. Concordando com a autora, assumo fazer parte deste quadro, posto que ministro disciplina de nome Conteúdo e Metodologia de História na instituição que trabalho.

Ao perceber tal diversidade, a Profa Andrea Lastória indicou uma dificuldade por parte dos profissionais envolvidos (sejam eles docentes, coordenadores ou discentes) em saber quais são os fundamentos teóricos que devem ser trabalhados na formação de professores? Que Conteúdo e que Método?

A comparação com Espanha e Portugal foi pertinente. No primeiro, a denominação desta área específica recebe a seguinte nomenclatura: Didática das Ciências Sociais. Longe da nossa experiência, a autora nos explicita que “tal área ou campo do conhecimento engloba, além da Didática da Geografia, a Didática da História e a Didática da História da Arte.” (p.297) Ou seja, a tal Metodologia do Ensino da Geografia faz parte de uma área maior – Didática da Geografia.

Utilizando dos preceitos de Rodriguez Lestegás (2000), Lastória nos esclarece a relação entre Geografia e a Didática da Geografia. Para o professor espanhol, existe uma espécie de “mito” de que os conhecimentos escolares (Geografia Escolar) sejam uma versão resumida dos saberes considerados científicos, uma “vulgata”. Salientando as diferenças, Rodriguez Lestegás auxilia a argumentação da Professora na medida em que confirma a diferença entre os saberes escolares e as ciências de referências, além de que este saber específico da escola transforma um saber erudito para responder às demandas do lugar a que se destina.

Após uma tessitura da história da Geografia Escolar brasileira, a autora compreende, tal como Selva Guimarães, que o as lutas sociais e acadêmicas permitiram alterações na compreensão do conhecimento Geográfico (Escolar). Hoje, podemos refletir formas de introduzir para além da questão das nomenclaturas, a sua conseqüência mais importante – as práticas escolares.

Para que se institua uma Didática da Geografia Escolar no Brasil é necessário uma atenção com a formação do professor naquilo que diz respeito aos vários tipos de conhecimentos. Sejam eles específicos da Geografia, pedagógicos, ou ainda pedagógicos do conteúdo, em outras palavras, a maneira como o professor pensa pedagogicamente um conteúdo. Nos dizeres de Andréa Lastória

... Tarefa que parece simples, mas que envolve a complexidade do mundo das práticas educativas, das políticas públicas de ensino, das diferentes concepções de Geografia e de Didática, entre inúmeras outras considerações.



* Mestre em História pela UNESP. Professor dos Cursos de História, Geografia e Pedagogia da Fundação Educacional de Fernandópolis/SP. Membro de grupos de pesquisa, em especial, o Grupo de Estudos da Localidade – GRUPO ELO/USP-Ribeirão Preto.

[1] VII Encontro Nacional Perspectivas de Ensino em História – Uberlândia/MG.

[2] Saliento também os outros textos que compõe as áreas de História e Geografia. Câmbios y continuidades dos autores Joan Pagés e Antoni M. S. Fernandez; Jogos digitais podem ensinar história? de Eucídio P. Arruda e Lana Mara C. Siman; da área de História tal como o Possibilidades criativas no ensino de Geografia: diferentes registros e linguagens na sala de aula, de Iara Guimarães, parte da Geografia.

4 comentarios:

  1. Quero me ater em duas questões acera da resenha escrita pelo Professor Rafael, em que, são apresentadas suas considerações referentes ao trabalho publicado, neste caso, o texto da Professora Lastória. intitulado: Didática da Geografia e Geografia Escolar.

    A primeira questão que quero abordar refere-se, a Geografia Escolar. Sou convicto da importância em torno desta temática. Cada vez mais, o professor, não apenas, na disciplina geográfica, é convidado a ver/rever a maneira como ele ministra suas aulas e também amplia seu fazer pedagógico. Torna-se de extrema importância buscar alternativas que contribua no processo de aprendizado do aluno, e o debate em torno de uma didática especifica para a Geografia, com isto, soma e muito, na tentativa de criar os meios que possam ajudar na investigação tanto dentro quanto fora da sala de aula na construção do conhecimento. A segunda questão, e que a meu ver, dá suporte acadêmico ao professor, e que temos a necessidade de ampliar esta discussão, é em torno da Didática da Geografia Escolar, tendo em vista a sua importância em torno da busca dos conhecimentos - são eles: o conteúdo específico, o pedagógico geral e o pedagógico do conteúdo. Tais conhecimentos vêem ao encontro, em que nós, professores, devamos estar inseridos num contexto em que o aluno possa vivenciar um ambiente construtivo e participativo no processo educativo. Para tanto, na formação dos professores, o domínio destes conteúdos, somam bastante a favor (apesar de inúmeras adversidades) e possibilita aos docentes, mecanismos que o ajude a desenvolver o raciocínio pedagógico, que possa contemplar tanto o ordenamento quanto o desenho de um novo referencial que atue em prol da educação.


    Marcio A. Couto
    Professor Geografia – Ribeirão Preto–SP / Brasil

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  2. Adriana Cristina de Godoy24 de febrero de 2010, 13:28

    Concordo com o comentário do Prof. Marcio ao evidenciar a importância da compreensão da forma como o aluno aprende, por parte dos professores, tema que fora levantado pela Profa. Andrea.
    Ao ler o texto da Profa. Andréa Coelho Lastória e a resenha do Prof. Rafael Cardoso de Melo, podemos chegar cada vez mais à conclusão do quanto se faz necessário às Didáticas em seus campos específicos, aqui, em especial, a Geografia e a História, serem objeto de estudo e pesquisa.
    Um caminho que vem sendo construído diariamente.

    Adriana Cristina de Godoy
    Professora de História
    Grupo ELO/USP
    Ribeirão Preto-SP/ Brasil

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  3. Escrevo apenas para destacar a importância da publicação de obras coletivas (como esta, organizada pela professora Doutora Selva Guimarães Fonseca, da Universidade Federal de Uberlândia) para a implementação de novas reflexões docentes, práticas educativas e pesquisas educacionais no Brasil.

    Compartilho, também, com os dois comentários já enviados (pelo Marcio Couto e pela Adriana Godoy).

    Por ser membro colaborador do grupo de pesquisa ELO (Grupo de Estudos da Localidade da FFCLRP / Universidade de São Paulo) tive acesso ao livro ENSINO FUNDAMENTAL e explicito aqui meus sinceros elogios a todos os autores do mesmo. Estes, por serem de variadas áreas do conhecimento escolar (História, Geografia, Matemática, Artes, Educação Física, Ciências e Língua Portuguesa) retratam muito bem o contexto brasileiro da escola básica.

    Evandro Gaiad Fischer
    de Pirassununga - SP, Brasil

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  4. Ensinar história e geografia;bom para isso surgem algumas perguntas que nem um professor ou pesquisador consegue responder,qual o interesse das crianças nessas matrizes?a criança não consegue entender sua própria história geográfica,assim sendo,qual a finalidade de se ensinar história e geografia,se não condiz com a realidade dos alunos,os não entende suas próprias?

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