sábado, 31 de julio de 2010

REDLADGEO organiza Colóquio Internacional de Investigadores em Didáctica da Geografia

Universidade de S. Paulo, 14 a 19 de Maio de 2010

Sérgio Claudino
Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa



A REDLADGEO - Rede Latinoamericana de Investigadores em Didáctica da Geografia, criada em 2007, organizou na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo/FEUSP, de 14 a 19 de Junho de 2010, um Colóquio Internacional de Investigadores em Didáctica da Geografia.

No seu Comité Executivo, a REDLADGEO compreende investigadores de Colômbia, Brasil, Chile, Argentina e Venezuela, e tem a coordenação da Sónia Castellar, da FEUSP, e Nubia Moreno, da Colômbia. Esta última investigadora, da Universidad Distrital Francisco José de Caldas/Bogotá, de Bogotá, é também uma das responsáveis da GEOPAIDEIA, que agrupa investigadores em Didáctica da Geografia da Colômbia e, por último, integra igualmente o Conselho Directivo do GEOFORUM. Numa nota mais pessoal, foi devido a um texto publicado no GEOFORUM que fui convidado a participar neste evento. Intersectam-se e complementam-se as redes de investigação em Didáctica da Geografia no espaço iberoamericano. Quando se fala de territórios organizado em rede, os investigadores de Didáctica da Geografia surgem entre os seus protagonistas.

A realização deste Colóquio Internacional constitui um sinal do dinamismo que nos vem da América Latina – de resto, a sugestão de realização do mesmo surgiu no 12º Encontro de Geógrafos da América Latina, que decorreu em 2009, em Montevideu. A maioria dos participantes proveio do Brasil, como se esperaria, estando ainda presentes investigadores de Argentina, Chile, Colômbia (um grupo numeroso) e Portugal.

O Colóquio Internacional contou com perto de 100 investigadores, muitos deles muito jovens, na sua maioria também comunicantes e enquadrados em grupos de pesquisa das suas universidades. Sem o gigantismo de outros eventos, teve uma boa dimensão como espaço de debate; contudo, foram mais as convergências do que as diferenças de perspectiva entre os seus participantes. Na sua generalidade, eram professores universitários ligados à formação de professores de Geografia e docentes que estão a fazer os seus mestrados e doutoramentos em educação. Como noutros eventos, sente-se um pouco a ausência do professor de Geografia “comum”, com os seus anseios, desafios e expectativas. Note-se que a relevância da educação geográfica nos currículos escolares é um pouco díspar na América Latina: se assume uma assinalável importância no Brasil, tem uma escassa presença em países como a Colômbia ou o Chile, onde surge muito associada às Ciências Sociais.

O Colóquio prolongou-se entre 2ª feira e sábado. O primeiro dia, o terceiro e o quarto dia foram preenchidos com sessões de manhã e de tarde; o segundo dia teve apenas a sessão de manhã, que da parte da tarde a equipa do Brasil jogava no Campeonato do Mundo de Futebol e o país quase pára para assistir. Os últimos dois dias do Colóquio foram de trabalho de visita à cidade de S. Paulo (6ª feira) e aos seus bairros periféricos (sábado) – o que tem toda a pertinência numa reunião de geógrafos ligados ao ensino.

O Colóquio iniciou-se pela apresentação do livro publicado pela GEOPAIDEIA, compilado por Nubia Moreno Lache e Mario Fernando Hurtado Beltrán, “Itinerarios Geográficos en la Escuela: Lecturas desde la Virtualidad” - que nos remete, desde logo, para os novos percursos didácticos que o espaço virtual potencia. Este segundo livro da GEOPAIDEIA é uma obra colectiva de 18 investigadores, maioritariamente da REDLADGEO, mas que conta igualmente com o contributo de Souto González, que preside ao Conselho Directivo do GEOFORUM. A publicação pode ser descarregada do site da GEOPAIDEIA, o que universaliza o seu acesso e lhe confere um utilidade acrescida.

O Colóquio foi marcado pelo debate sobre a relação a Geografia Académica, a Didáctica da Geografia e a Geografia Escolar. A Didáctica foi considerada um dos ramos da Geografia Académica e insistiu-se na matriz comum entre esta e a Geografia Escolar, entendida como uma recontextualização da própria Geografia Académica. Neste sentido, contesta-se o modelo de transposição didáctica de Yves Chevallard, por se colocar os alunos como ponto de partida do processo de aprendizagem e, não, como destinatários do mesmo, como surgem no conhecido modelo francês; de resto, alguns intervenientes reclamaram uma abertura filiação nas perspectivas construtivistas da aprendizagem. As teorias de Vygotsky sobre a construção do conhecimento surgem, entretanto, como dominantes.

Do ponto de vista epistemológico, vários participantes reclamaram uma filiação na Geografia Humanista e na Geografia Fenomenológica; contudo, o grande académico de referência é Milton Santos, citado pela generalidade dos latino-americanos. No discurso de contestação ao sistema político-social e de enquadramento do papel da escola, são frequentes os discursos de de inspiração neomarxista. Não se identificam, entretanto, autores que constituam uma clara referência no âmbito da Didáctica da Geografia. Por outro lado, há um evidente alheamento em relação à Comissão de Educação Geográfica da União Geográfica Internacional e às suas iniciativas – todos terão a ganhar com uma aproximação recíproca.

O discurso sobre as competências na aprendizagem é quase ignorado, muito embora cheguem os ecos da sua actual relevância na Europa. Entretanto, foi defendido a valorização da educação geográfica em domínios diversos (nas artes, na literatura…), chamando-se a atenção para o facto de figuras cimeiras da Geografia Académica enveredarem cada vez mais por uma produção científica igualmente debruçada por várias áreas.

A cartografia surge como um instrumento fundamental para a apropriação do território pelos jovens, o que leva a vários projectos entre as autoridades regionais e locais e as universidades de construção de atlas escolares locais. Entretanto, num discurso em que os conceitos nem sempre foram muito clarificados, sublinhou-se o facto de o espaço resultar de uma construção social. É neste contexto que surge o desafio da cidadania, já que “nascemos pessoas, tornamo-nos cidadãos”, como referiu Alexander Cely, da Colômbia.

A cidade constitui o elemento central do discurso da Didáctico da Geografia. O projecto das cidades educadoras, com espaços públicos apropriados pelos habitantes e cidadãos participantes nas várias instâncias públicas de decisão tem um grande eco, bem como o da promoção de uma cultura cívica democrática através da educação. Assiste-se, pois, a uma ruptura clara com a tradição da escola regional francesa, na desvalorização de temas como a relação dos aspectos físicos e humanos na construção do espaço rural, por exemplo. A cidade surge na sua acepção mais ampla, de território fragmentado e apropriado por grupos com espacialidades distintas. Desenvolvem-se, entretanto, projectos de formação para a cidadania entre cidades como São Paulo, Medelin e Barcelona, mobilizando espaços sociais periféricos e com problemas comuns.

É neste contexto de valorização da cidade que o alargado grupo de participantes colombianos apresentou um inovador projecto de trabalho com jovens de bairros urbanos periféricos. Destaque-se, ainda, a parceria entre Sonia Castellar, da Universidade de São Paulo, de Helena Callai, da Universidade de Ijuí, e de Lana Cavalcanti, da Universidade Federal de Goiás: com sensibilidades complementares, a cooperação que mantêm há alguns anos estimula o trabalho recíproco e fortalece institucionalmente a própria Didáctica da Geografia.

Ao longo do Colóquio assistiu-se a uma assinalável divulgação de livros centrados no ensino da Geografia, no que constituiu também uma das mais valias deste Colóquio. No final, foi anunciada a realização de um novo Congresso, no Chile, em 2012. Este foi o I Congresso. Parabéns à REDLADGEO.

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